“Comportamentos comumente associados com a cultura do estupro incluem culpabilização da vítima, objetificação sexual, trivialização do estupro, negação de estupros, recusa de reconhecer o dano causado por algumas formas de violência sexual, ou alguma combinação entre esses comportamentos.”[1]
Como se preciso fosse, vamos ilustrar isso no assunto que interessa a esse blog:
No primeiro texto já esta explicita a opinião deste blog: pornografia objetifica mulheres como, como gostam de afirmar os misóginos de plantão, “depósitos de porra” [2]. Cada vez mais, filmes pornográficos mainstream são apenas a gravação de um estupro, mais ou menos violento, melhor ou pior pago ou produzido. Nesses mesmos filmes, no enredo, mulheres que contratam profissionais para reparos em casa, detidas por policiais em blitz ou QUALQUER OUTRA CIRCUNSTÂNCIA são passíveis de serem estupradas.
Pior: aparte os filmes onde o gozo reside na humilhação indisfarçada – e mesmo em alguns destes – as mulheres “gostam” de ser estupradas. Elas resistem no começo mas logo estão gostando. Elas dizem não querendo dizer sim, é só charme.
Finalmente: elas estavam pedindo.
Culpabilizar a vitima, outro sintoma da cultura do estupro, é um mecanismo nefasto que faz as vitimas acreditarem que a culpa é delas e minimiza a invasão e violência que é forçar, de qualquer forma, alguém a fazer sexo contigo.
A cultura do estupro também normatiza a erotização de crianças, em especial meninas, já que mulheres em qualquer idade estão “pedindo” e, permitam a repetição, são depósitos de porra.
Por outro lado, e ele sempre vem, a cultura do estupro também reforça o discurso moralista de enclausuramento e domesticação da mulher, já que mulheres de respeito não fazem uma porção de coisas que mulheres felizes fazem. É esse reforço, positivo da mulher recatada e negativo da mulher que “pede” sexo o tempo todo, que dissemina e facilita a ideia de que o corpo da mulher que ousa ocupar o espaço publico é também publico* e fortalece o ideal de família, fortaleza de todos os males morais. (Ou não, só especulando).
Essa bipolaridade da mulher é registrada na pornografia em uma dicotomia doente de mulheres virginais cada vez mais novas e putas piranhas da buceta louca pra ser arrombada. Afinal, todxs sabemos que mulher boa tem que ser uma puta na cama e uma santa na rua.
Ai que tá.
Pensa na maior de todas as santas. A MÃE de Jesus. Sem ela, ele jamais teria firmado seu pacto de mortalidade cos humano pecador e redimido noiz tudo.
Ok.
Ela SEMPRE foi virgem.
Ok.
Toda essa treta, no entanto, poderia ter sido evitada se a gente não pecasse. O que há algum tempo já ta complicado, posto que todo mundo nasce com a marca do pecado original.
E quem fez esse favor de pecar primeiro pra fuder com a porra toda?
CLARO, que tinha que ser uma mulher.
Eva fez o favor de comer a maçã. Que tanto significa tentar sequestrar o conhecimento negado por D-us quanto querer trepar. Já tão reconhecendo o cenário? A igreja não só demonizou as mulheres, como também demonizou o sexo por séculos. (Mesmo dentro do casamento, só aceito e sacramentado pela igreja no século XVIII). A igreja e seu machismo como cultura influenciaram a forma como as ciências em geral tratam a sexualidade: já que não existem demônios na ciência, a misoginia assumiu a forma de doenças e desvios, tanto de caráter moral quanto de saúde. Os estudos sobre a sexualidade da mulher se resumiram até o século XX ao sistema reprodutor, e não à sua totalidade, como por exemplo fonte de prazer. O clítoris é uma descoberta recente. As vezes sequer foi descoberto.[2]
Além de negar o prazer às mulheres, a quem o cara lá de cima reservou apenas culpa – lembra do primeiro sintoma da cultura do machismo? – as igrejas, incluam-se aqui as neo pentecostais, defendem que mulheres devam servir aos maridos, ser recatadas, e isso também se aplica ao sexo em si, reduzido a reprodução. Com ou sem geração de descentes, mulheres são tratadas como depósitos de porra.
* Estupro é uma violência fundamentalmente de atestação de poder. A violência sexual não é fruto apenas da pornografia, ela é uma forma utilizada pelo machismo para coagir, violentar e assassinar mulheres.
[2] https://www.youtube.com/watch?v=AAOgnyiKiqU